Uma palavra da moda hoje em dia é “rede”. Milhões de pessoas navegam com prazer nas “redes sociais”. É praticamente impossível viver sem elas. A Igreja nos convoca a fazer de nossas paróquias “rede de comunidades”. Muitos incentivam as articulações em ‘rede’ para somar forças e atingir objetivos comuns. Ficou famoso também o filme “Rede de intrigas”, que faz uma crítica severa à falta de ética, à massificação e à manipulação da grande mídia.
E, como canta a Roberta Miranda, quem não sonha com uma “rede preguiçosa pra deitar”?... Afinal, ninguém é de ferro, e todos precisamos de momentos de descanso, de lazer e de prazer. É... as redes fazem parte da vida.
Mas... por que estou dizendo tudo isso? É que há poucos dias caí nas redes do Evangelho de uma forma diferente. Sempre li e ouvi os relatos que falam da vocação dos apóstolos e da pesca milagrosa entendendo que nossa missão é lançar as redes e atrair gente para Deus, para o bem, para a Vida. A rede seria o sinal do amor bonito de Deus que acolhe a todos sem distinção e nos atrai para ele. Ou, como diz o salmo 144, dessa “ternura que abraça toda criatura”.
Ouvindo o texto da vocação dos primeiros discípulos (cf. Mt 4,18-22), vemos que Simão Pedro e André estão lançando as redes quando Jesus passa e os chama. Porém, Tiago e João estão “consertando as redes”. Então me dei conta que, de fato, essa é uma cena muito comum entre os pescadores: consertar redes.Toda tarde, lá estão eles cumprindo pacientemente essa tarefa. E disso depende todo o sucesso da pesca.
O desgaste é natural. Com o passar do tempo, as redes vão relaxando, envelhecendo, se (cor)rompendo. Surgem os buracos. Se a gente não faz os reparos necessários, a pesca fica comprometida. Assim, não dá pra achar que é perda de tempo deixar a pesca e, com paciência, tirar um tempo para consertar.
E fiquei pensando que o mesmo acontece com as redes da vida: nas relações, no trabalho, na missão. Na relação com o outro, tecida com os fios do amor, do diálogo, dos ideais em comum, o desgaste é com certeza inevitável. Todos experimentam isso. Não é à toa que uma das iniciativas da Pastoral Familiar é promover, de vez em quando, a “revisão matrimonial”. É indispensável. Rever, conversar, avaliar, pedir e oferecer perdão, assumir propósitos, esclarecer mal-entendidos...
O mesmo precisa acontecer na vida pessoal. Momentos de reflexão, de avaliação. Iyanla Vanzant, em seu livro Enquanto o amor não vem, fala dessa visita aos nossos porões para reciclar o que ainda serve e descartar o que só ocupa espaço e pra nada serve.
E essa é também uma necessidade da Igreja, em nossa missão de evangelizar e promover a vida. Os tempos mudam. Há novas exigências. Os desafios são outros. A nossa linguagem, o nosso jeito de agir, os nossos métodos podem já não estar funcionando a contento. O Documento de Aparecida fala da importância de superar as estruturas caducas, “abandonar as ultrapassadas estruturas que já não favoreçam a transmissão da fé” (DAp 365).
Em sua visita ao Brasil em 2013, por ocasião da Jornada Mundial da Juventude, o papa Francisco dizia com coragem aos cardeais que “a Igreja está atrasada” e mantém “estruturas caducas”. Em sua fala ao episcopado lembrava que “as redes da Igreja são frágeis, talvez remendadas”.
Penso que, com bem mais frequência do que imaginamos, é fundamental dar um tempo, interromper um pouco o trabalho, sentar para ver se a rede está trazendo e aproximando peixes, ou os deixando escapar. Jesus nos encontra e nos fala não só enquanto estamos na pesca, mas também quando nos encontramos, como Tiago e João, consertando redes...
Pe. José Antonio de Oliveira