Dois anos de Luta

04/11/2017 às 14h19

A maior tragédia socioambiental do país completa dois anos neste domingo (5). O rompimento da barragem de Fundão destruiu casas, distritos, rios e matou 19 pessoas. Dois anos depois, as inúmeras famílias esperam pelo reassentamento, o cadastro definitivo e a oportunidade de reconstruir suas vidas.

Em uma coletiva de imprensa realizada na manhã deste sábado (4), em Mariana, atingidas de Bento Rodrigues, Paracatu de Cima, Patacatu de Baixo e o promotor de Justiça, Guilherme Meneghin, apresentaram um balanço dos últimos meses. A coletiva foi organizada pela Comissão dos Atingidos e o Jornal A Sirene e contou com o apoio da assessoria técnica da Cáritas.

Com início das obras do reassentamento atrasadas, os atingidos questionaram a atuação da empresa. “Há dois anos estamos aqui sem apoio. Não tivemos nenhum retorno positivo da empresa. Nós não estamos caminhando”, disse Janaína Cecília, de Bento Rodrigues.

Segundo Guilherme Meneghin os consecutivos erros cometidos pela Samarco e a Fundação Renova estão atrasando o processo do reassentamento. “Eles cometeram uma série de erros no processo, o que acabou atrasando o início das obras. O reassentamento depende de uma autorização do estado, da Secretaria do Estado de Meio Ambiente, por meio de um licenciamento ambiental, só que o licenciamento só pode ser iniciado com o projeto regular das obras e com o registro dos terrenos onde será feito o reassentamento. Essas são duas coisas que a Fundação Renova e a Samarco não fizeram”, disse Meneghin.

A preocupação com o que será feito com o velho Bento e com Paracatu foram encerradas com a anulação da hipótese de permuta das terras. Guilherme Meneghin explica que a empresa pretendia impor aos atingidos a troca da área do reassentamento, a que as famílias têm direito, pelo patrimônio original das comunidades de Bento Rodrigues e de Paracatu, o que era rejeitado pelos atingidos. “Na audiência do dia 05 de outubro foi superado a hipótese da permuta. Onde foi feito um acordo que a empresa abre mão da permuta de imóveis e a destinação final das áreas atingidas será definida pelos próprios moradores, em conjunto com o Ministério Público”, conta o promotor.

Meneghin completou que o Ministério Público entrou com uma nova ação. “No dia 1° de novembro, entramos com mais uma ação. Dessa vez cobrando que a empresa cumpra com o dever de fazer o reassentamento das vítimas até o dia 31 de março de 2019, como prometido, sobre pena de multa de 20 milhões de reais por dia de atraso. Essa ação é necessária, porque todos os problemas que foram relatados são frutos de um padrão de atuação desrespeitoso, com ausência de transparecia que levou aos atrasos no processo”, disse Guilherme.

A luta pelo reconhecimento

Outra luta vivida pelos atingidos é a de serem reconhecidos e conquistarem direitos básicos, como o do cadastro definitivo, que não foi realizado e ainda está em discussão pelos envolvidos. Os dados deste cadastro serão utilizados pela empresa para ressarcir as famílias atingidas.

“A empresa negou entregar o cartão pra mim. Sou atingida e a empresa fala que eu não preciso. Eu nunca precisei da mineração. Eu lutei a vida inteira trabalhando, hoje eu não consigo trabalhar, eu não consigo poder sair, mas a empresa fala ‘você não tem direito’. Como eu não tenho direito? Eu não consigo levar um currículo. Quando eu chego a um lugar para apresentar um currículo eles falam: ‘você não pode trabalhar, você não precisa, você é atingida, você tem o cartão da Samarco’. Mentira, eu não tenho o cartão, eu fui negada”, ressalta Janaina.

Assim como Janaina, outros atingidos sofrem pela falta de apoio. Para Luiza Queiroz, de Paracatu de Baixo, se o cadastro está atrasado à culpa é da empresa. “Ela é responsável por esses dois anos de abandono, por esse sofrimento. Nós trabalhamos em uma equipe do cadastro que foi conquistada em audiência. Essa audiência em que queriam limitar os nossos direitos. Nesta audiência nós conseguimos a reformulação desse cadastro. Esse cadastro já foi aplicado por Barra Longa abaixo e agora o povo está penando, entrando na justiça. Nós não queremos o mesmo fim. Nós temos o nosso direito, o direito de Mariana fazer um cadastro que tenha a nossa participação”, afirma.

Fruto da luta construída junto aos atingidos, na audiência de reconciliação, do dia 5 de outubro de 2017, ficou acordado que todas as pessoas que se declararem atingidas pelo rompimento da barragem poderão preencher o cadastro de levantamento de perdas, sendo que o direito à indenização será analisado posteriormente. Para isso serão utilizados relatos por escrito ou por registro audiovisual e a análise do cadastro será tanto individual quanto por núcleo familiar, garantindo que, caso haja mais de um núcleo familiar em uma mesma residência, cada um deles terá direito a constituir uma unidade de análise distinta.


Voltar

Confira também: