Viver o mistério trinitário

23/05/2018 às 09h59

Côn. José Geraldo Vidigal de Carvalho*

Na ordem dada por Jesus aos apóstolos aparece claro o dogma trinitário: ”Ide, pois, ensinai todas as gentes, batizando-as em nome do Pai e do Filho e do Espírito Santo” (Mt 28,16-20). Verdade essencial da fé cristã. Em Deus há uma só natureza, uma só substância e três pessoas realmente distintas. Desde toda a eternidade, o Pai se conhece e este conhecimento é o Filho. O Pai ama o Filho e este o Pai com um amor eterno, infinito, que é Espírito Santo. Eis porque São João afirmou: “Deus é amor”. (1’ Jo 4,80). A Trindade designa assim a comunhão de amor entre o Pai, o Filho e o Espírito Santo. Eis porque a Igreja é o sinal da comunhão do amor trinitário. De fato é um só corpo, embora seus membros espalhados pelo mundo inteiro sejam diversos. São cristãos solidários vivendo do mesmo Espírito. Os liames que ligam os batizados uns aos outros são o sinal da verdadeira humanidade. Eis aí um adequado reflexo do mistério trinitário.

Jesus, o Filho de Deus Encarnado, vindo a este mundo, mostrou que Deus é Pai que quis fazer os homens seus filhos adotivos, através do Espírito Santo. São Paulo pôde então afirmar que “recebemos o espírito de adoção filial, pelo qual bradamos: Abá, ó Pai!”. E, se somos filhos, somos igualmente herdeiros de Deus e coerdeiros de Cristo (Rm 8,15-17). Assim sendo, quem quer conhecer a Trindade deve viver com ela, entrar em relação com o Pai, o Filho e o Espírito Santo. Tal a prerrogativa do batizado: ter parte no mistério da comunicação entre o Pai, o Filho e o Espírito Santo. Pelo dom do batismo o próprio Deus nos revelou qual é a sua essência. Há uma comunhão e um diálogo eterno entre o Pai, o Filho e o Espírito Santo. Ai está a Trindade imanente da qual o cristão deve participar pelo amor que o liga a Deus Uno e Trino e o une a todos os irmãos na mesma Igreja deste Deus que é amor. Donde a necessidade de compreender e viver esta presença de Deus no mundo no qual se vive. Deus, que está presente por toda parte, não pode ser o grande ausente na existência de cada um. É que este Deus não se impõe, mas se propõe, sempre respeitando a liberdade humana. Ele é discreto porque é tão somente amor.

Cabe aos seguidores de Jesus manifestar a presença deste Deus Uno e Trino e isto se dá de maneira especial quando os cristãos estão reunidos em oração sobretudo através do culto eucarístico. Então se depara a luz da palavra divina que ilumina por meio do Espírito Santo. É neste momento que se penetra ainda mais no mistério trinitário, testemunhando a realidade de ser bem amados do Pai, unidos ao Filho e iluminados pelo Espírito Santo. É a beleza da comum unidade dos batizados uns com os outros e com seu Deus. Deste modo, se pode agir no mundo patenteando os valores espirituais que ultrapassam de muito os bens meramente materiais. É a força da fraternidade cristã que torna a Igreja missionária, visível aos olhos de todos que não conhecem verdadeiramente a Deus. Esta fraternidade que flui da unidade divina não é um mero humanitarismo, mas o amor vindo do alto, descendo do Deus Uno e Trino. Trata-se de uma dileção fraternal que prende à sua fonte a qual une o Pai, o Filho e o Espírito de amor. Eis aí como se deve viver o mistério trinitário em toda sua profundidade e extensão. A solenidade da Santíssima Trindade, celebrada no próximo domingo, irradia então alegria e paz, frutos de uma união vital com Deus e com os irmãos. Como ensina o Catecismo da Igreja Católica no número 266 “do Pai, do Filho e do Espírito uma é a divindade, igual a glória, coeterna a majestade”. Imitar, portanto, a Trindade Santa é nunca o cristão se julgar superior aos outros. Cumpre a cada um viver para o outro, porque todos somos iguais perante um Deus no qual nenhuma das três pessoas é superior às outras, mas coexistem na mesma natureza desde toda a eternidade, unidas pelo vínculo do amor. Esta igualdade mostra o que é a verdadeira unidade. Daí resulta a fecundidade infinita de Deus cujo amor se reflete em todas as suas obras, sobretudo no ser humano, criado à sua imagem e semelhança. Verifica-se assim uma gratuidade admirável. É preciso, portanto, imitar ao Deus Uno e Trino através do amor mútuo associado cada um a este mistério admirável. É pela unidade perfeita que os cristãos manifestam ao mundo a beleza da Santíssima Trindade.

*Professor no Seminário de Mariana durante 40 anos.


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