Côn. José Geraldo Vidigal de Carvalho*
Marcante a indagação que Jesus fez aos apóstolos: “E vós quem dizeis que eu sou?”. (Mc 8,27-350 Admirável a resposta de Pedro: “Tu és o Messias”, ou seja, o Ungido. O termo deriva do fato de que no Antigo Testamento os reis, os profetas e os sacerdotes, quando eleitos, eram consagrados por uma unção de óleo perfumado. A Bíblia profetiza um Ungido ou Consagrado especial que viria para realizar as promessas de salvação que Deus fizera a seu povo. Intenso o messianismo bíblico e foi nesse sentido que o Apóstolo caracterizou Jesus como o Esperado salvador. O próprio Cristo proclamaria que Ele era o Messias ansiosamente aguardado. Com efeito, diante do Sinédrio tal a resposta que Ele deu ao Sumo Sacerdote que o interrogou: “Tu és o Messias, o Filho do Deus bendito”? Jesus foi claro: “Eu o sou”. (Mc 14,61 ss). De fato, Ele estabeleceria o poder de Deus sobre a terra, operando em nome de Deus uma mudança decisiva na história da humanidade. Eis a sua missão: reconciliar os homens com Deus. Portanto, Pedro foi preciso na sua colocação. Os judeus fervorosos colocavam no Messias a esperança de uma renovação cabal dos corações, mais do que uma mera restauração nacional para Israel. Para que não pairasse dúvidas sobre sua tarefa salvífica, Jesus descreveu a figura do Messias sofredor, rejeitado pelos anciãos, pelos grão-sacerdotes e pelos escribas. Seria morto, mas ressuscitaria. Não era, porém, assim que Pedro vislumbrava o Messias que passaria por terríveis tormentos. Foi duramente repreendido pelo Mestre. Não obstante, através dos tempos muitos quereriam um Messias sem a Paixão e Morte no Calvário; desejariam as Bem-aventuranças sem a Cruz; a amizade de Jesus sem uma profunda conversão do coração. Deste modo, ocorrendo uma deturpação da missão de Cristo, pois Ele viera redimir pelo sacrifício total. Jesus chamou então Pedro de Satanás, pois o Pai da Mentira é que almejava que o poder divino e os milagres estivessem a serviço de um ilusório reino messiânico. Eis porque Jesus se serviu daquela circunstância para mostrar que segui-lo seria ir atrás de um Crucificado numa renúncia cotidiana de si mesmo, carregando cada um sua própria cruz, pois a dele Ele carregaria até o Calvário. Isto, contudo, não numa valorização errônea do sofrimento em si, pois o que realmente glorifica a Deus é o amor que transfigura os espinhos da vida em pétalas para a eternidade Eis aí o mistério da vida de Jesus no qual o ápice dos tormentos coincide com a culminância de uma dileção sem limites. Impossível ao homem penetrar nos planos divinos que assim traçou o caminho da salvação. O cristão só entenderia os dissabores terrenos se os colocasse no horizonte de um amor eterno. É penetrando fundo na obra redentora de Jesus, o Messias sofredor, que seus discípulos entenderiam o que disse o poeta Musset: “O homem é um aprendiz, a dor o seu mestre, e ninguém se conhece enquanto não sofreu”. Percebe então que os desgostos são uma lição sobre a gravidade do pecado, um apelo ao desprendimento e à união com o divino Mártir do Gólgota num superação cotidiana de si mesmo, Compreende também que a amargura é fonte de purificação, de força e, num paradoxo sublime, fonte até de esperança. Donde as palavras de São Paulo, “Não há proporção alguma entre as provações deste mundo e a glória que um dia se manifestará em nós” (Rm 8,18). O segredo é fazer das contrariedades atos de amor. Paul Claudel, renomado literato francês, assim se expressou: “Feliz daquele que sofre e que sabe para sofre. Quem tudo isto medita não acha a cruz bastante pesada nem provação bastante amarga, pois a cruz, é um dom que Deus faz a seus amigos. Pedro entenderia isto somente mais tarde quando ele também muito teria que padecer pela evangelização. Cumpre então ao seguidor de Cristo se abandonar à sabedoria de Deus, entregando as aflições deste exílio terreno nas mãos de um Pai amoroso. Nele depositar esperança e alegria. Dele vem a força para carregar a cruz e seguir Jesus. Cumpre total adesão ao projeto de Deus vivendo na confiança nesta caminhada rumo à glória eterna. A paixão e a morte se ajuntaria à encarnação do Verbo de Deus e fariam dele um homem como nós, companheiro de cada um que sofre neste exílio terreno rumo à pátria verdadeira, conquistada pelo seu sangue redentor.
* Professor no Seminário de Mariana durante 40 anos.