O milagre em Caná da Galileia

14/01/2019 às 10h16

Côn. José Geraldo Vidigal de Carvalho*

Todos os pormenores do célebre milagre operado por Jesus em Caná da Galileia são profundamente significativos e, entre eles, aquilo que sua Mãe falou aos que serviam os convidados daquela festa de casamento: “Fazei tudo que Ele disser” (Jo 2,1-11). Ao pedido de Maria, sua Mãe, Jesus antecipou o momento no qual ele devia começar a revelar sua glória, seu poder divino. A ordem dada por Cristo, por certo, causou estranheza àqueles serventes: “Enchei de água essas talhas”. Eles as haviam esvaziado após as abluções rituais dos convivas e ali estavam seis vasilhames vazios, podendo cada um conter cerca de 40 litros. Adite-se que os convidados já estavam à mesa e, portanto, se tratava aparentemente de um trabalho inútil. No entanto, Maria, mais pelo acento afetivo da voz do que pelas palavras, lhes havia convencido a obedecer fielmente o que seu Filho lhes mandaria fazer. Por isso encheram logo as talhas de água, tendo Jesus ordenado que as levassem ao mestre da mesa. O milagre havia sido realizado e Cristo se serviu da ação daqueles serventes para proporcionar a todos naquela festa um vinho de superior qualidade. Aquela bebida mereceu inclusive a congratulação ao esposo que tinha invertido a ordem, oferecendo o vinho melhor depois de um inferior. O Evangelista não desceu a outros detalhes nem mesmo como o papel de Maria foi reconhecido. Muito sobriamente menciona que aquele foi o primeiro dos sinais operados por Jesus que manifestou a sua glória e que os discípulos creram nele.  Ressoa, porém, as palavras de Maria: “Fazei tudo que Ele vos disser”. Aí o segredo de uma espiritualidade profunda dos que querem, de fato, seguir Jesus, ou seja, fazer em tudo a vontade de Deus. Mais tarde Jesus ensinará a rezar ao Pai que está nos céus: “Seja feita a vossa vontade”. Esta liberdade do coração que quer em tudo o que Deus quer é uma das lições deste episódio em Caná. Trata-se da obediência salvífica e, assim, o fiel pode tudo, como asseverou São Paulo: “Eu tudo posso naquele que é a minha fortaleza” (Fil 4,13). A adesão completa aos desígnios de Deus comunica a cada cristão um vigor sobrenatural conferido pela graça, nobilitando-o, unindo e coordenando todas as ações num sistema de vida compacto, totalmente inspirado na submissão ao Senhor de tudo. Cumpre esvaziar as taças do vinho velho da desobediência aos mandamentos para que Jesus nelas coloque o vinho novo da adesão completa aos preceitos divinos. Para que isto ocorra é imperiosa a presença mediadora de Maria que se tornou para todos um modelo, ela que havia dito ao Arcanjo Gabriel: “Eu sou a serva do Senhor, faça-se em mim segundo a tua palavra”. Ela alcançou em Caná aquele milagre da parte de seu Filho graças à sua grande humildade. Muitas vezes na vida dos seguidores de Cristo é a falta desta virtude basilar que leva ao desprezo dos dez mandamentos, julgando-se a criatura mais sábia do que o Criador de tudo. Quem imita a submissão de Maria abre todas as possibilidades da ação de seu Filho que pode então agir e operar maravilhas. A seu Filho, lá em Caná, ela não deu uma ordem, mas simplesmente expôs uma situação: “Eles não têm mais vinho”. Quantos, porém, querem trazer Deus a seu próprio tribunal, ignorando inclusive que somente Ele sabe o que é melhor para cada um.  Há até aqueles que fazem de suas preces imposições ao Senhor Onipotente, julgando-se merecedores de tudo, esquecidos de que é preciso primeiro purificar o coração, afastando tudo que desagrada a Deus. É necessário ao orante ajustar sempre a própria vida à vontade divina para tudo alcançar de seu Senhor, a quem deve manifestar uma confiança absoluta,envolta numa resolução sincera de mudança de vida.  Adite-se que Maria continua através dos tempos a ser a poderosa intermediária e recorrer a ela significa poder sentir os efeitos de suas súplicas maternas junto de seu Filho, como ocorreu em Caná da Galileia.

* Professor no Seminário de Mariana durante 40 anos.


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