O assunto do momento é a famosa reforma da Previdência. E aparece tanta coisa que muitos ficam sem saber como se posicionar. É preciso mesmo fazer uma reforma? Como fazer? A quem interessa? Como se posicionar? Não sou especialista no assunto, mas podemos colocar algumas questões.
Em primeiro lugar, o principal argumento para a reforma é de que o atual sistema é deficitário. Dá prejuízo. E aqui já cabe um esclarecimento: Previdência social não é para dar lucro. É uma obrigação do governo e direito da população. Faz parte da “Seguridade Social”, prevista na Constituição Federal. O artigo 194 diz que a “seguridade social compreende um conjunto integrado de ações de iniciativa dos Poderes Públicos e da sociedade, destinadas a assegurar os direitos relativos à saúde, à previdência e à assistência social.”
O art. 201 esclarece que “a previdência social será de caráter contributivo e de filiação obrigatória, e atenderá, nos termos da lei, a cobertura dos eventos de doença, invalidez, morte e idade avançada; proteção à maternidade, especialmente à gestante; proteção ao trabalhador em situação de desemprego involuntário; salário-família e auxílio-reclusão para os dependentes dos segurados de baixa renda; e pensão por morte do segurado, homem ou mulher, ao cônjuge ou companheiro e dependentes...”. Portanto, ela depende da filiação e da contribuição, mas não pode ser vista como fonte de lucro.
A própria Lei já prevê os recursos, que provêm da contribuição da pessoa, empregados e empregadores, além de vários impostos que garantem o fundo necessário, como COFINS, PIS etc. E há outras fontes. Das loterias, como a mega-sena, por exemplo, de cada prêmio, 13,8% é imposto para o Governo e 18,1% é destinado à Seguridade Social. Os ganhadores só ficam com 32,2% da arrecadação (prêmio líquido).
Com o aumento da média de vida, é natural que haja um reajuste da idade. Mas há outras mudanças que podem ser feitas, sem pesar para os contribuintes, sobretudo os mais pobres, os idosos e as pessoas que trabalham no campo ou residem em regiões onde a média de vida é menor.
Por exemplo: um fator que pesa muito são as dívidas com a Previdência. Segundo dados do próprio Governo, essa dívida chega a cerca de 490 bilhões de reais. Só a JBS deve mais de dois bilhões e trezentos milhões.
Também as renúncias fiscais pesam. Embora o princípio seja bom, de repassar parte do imposto devido a iniciativas privadas, muitas vezes isso se faz de forma injusta, deixando de lado os mais necessitados. Em 2017, essas renúncias somaram R$ 354,7 bilhões, que equivalem a 30% da receita líquida do governo no ano.
Há ainda outros mecanismos, como o crédito consignado, que permite aos bancos usar dinheiro das aposentadorias e pensões para a capitalização e exploração. E aqui está uma das piores armadilhas da proposta de reforma do atual governo, a capitalização individual, ou seja, você só terá direito ao que contribuir individualmente. Ela garante apenas a aposentadoria, deixando de lado todos aqueles direitos citados acima e que são garantidos pela Constituição. E somente o contribuinte seria o responsável para garantir o fundo necessário. As empresas, os empregadores e o Governo ficariam isentos dessa responsabilidade. E os bancos poderão investir com o dinheiro arrecadado. Resumindo, a reforma livra o Governo da responsabilidade pela seguridade social, facilita tudo para os empresários e garante aos bancos lucros exorbitantes, sem qualquer garantia para os trabalhadores. Sem contar que diminui em muito o salário de quem se aposenta, podendo chegar a menos da metade do mínimo.
Este modelo foi idealizado pelo Banco Mundial, nos anos 90, e vários países da América Latina o adotaram. No Chile, por exemplo, que adotou o sistema de capitalização em 1983, 79% dos benefícios são menores que um salário mínimo e 44% dos aposentados e pensionistas vivem abaixo da linha da pobreza, segundo o Instituto Brasileiro de Direito Previdenciário. Agora, depois de ver sua população idosa cometendo suicídio por conta de não conseguir se sustentar, o Chile já pensa em reestatizar o sistema.
Não dá pra engolir. É hora de ir para as ruas e gritar, ir para as redes sociais, pressionar os deputados. Porque o próprio presidente, durante a campanha eleitoral, gritava que isso é um crime, mas agora está disposto a pagar milhões aos parlamentares para aprovar sua proposta que, por sinal, é pior do que a anterior.
Pe. José Antonio de Oliveira