Domingo de Ramos e da Paixão do Senhor

08/04/2019 às 11h05

Côn. José Geraldo Vidigal de Carvalho*

Neste domingo celebramos dois acontecimentos opostos: a entrada triunfal de Jesus em Jerusalém e sua ignominiosa condenação à morte no alto de uma cruz. À apoteótica chegada de Cristo na famosa capital por entre o alvoroço do povo a liturgia apresenta sua saída desta cidade para ser crucificado, sendo grande a animosidade de muitos que antes o aclamaram. Há, porém, pontos comuns entre os dois fatos, envolvendo a volúvel multidão e Jesus, que deixam uma mensagem profunda no início da Semana Santa. Com efeito, nossa atitude de fé em Cristo Salvador deve nos levar a um olhar de uma crença inabalável na pessoa do divino Redentor. De fato, através dos tempos, muitos cristãos se mostram receptivos àquele Jesus triunfante, mas não vivem o mistério de seus sofrimentos. Por vezes, acolhem com alegria Cristo e seu Evangelho e, depois, não se manifestam em plenitude como discípulos daquele que foi traído e morto por entre terríveis sofrimentos. É o contraste entre rezar a Deus: “não nos deixeis cair em tentação” e, depois, não evitar as ocasiões de pecado. Muitos a se encherem de confiança no poder do Filho de Deus e, posteriormente, a duvidarem da eficácia de sua força salvadora. É a falta do olhar de uma fé profunda e abrangente. Será depois de seus sofrimentos humilhantes que, após sua morte, raiará o verdadeiro triunfo de Cristo que foi sua Ressurreição dentre os mortos. Eis porque é de suma importância penetrar fundo no valor único e universal da Paixão de Cristo. É por ela que se deu a reconciliação de Deus com os homens.

Cumpre ponderar as palavras de São Paulo: “Deus estava em Cristo, reconciliando consigo o mundo, não imputando aos homens os seus pecados e depondo em nossos lábios as palavras da reconciliação" (2 Cor 5,19). A paixão de Cristo foi fonte de salvação, fruto de um amor sem limites. Para alcançar a vida eterna é preciso a seu exemplo abraçar a cruz de cada dia para se chegar à vida eterna. Durante a Semana Santa é necessário que, perante os sofrimentos de Jesus, se tenha consciência da gravidade dos pecados para deles se arrepender e poder gozar das alegrias da Páscoa com um coração inteiramente renovado. A morte de Jesus deve ser uma lição de vida longe dos desvios éticos que podem manchar o cristão. Fechar o coração a uma tristeza vazia, a um dolorismo inútil, por causa dos sofrimentos de Cristo, mas abrir este coração à ação da graça regeneradora. O drama da paixão de Jesus revela a grandiosidade da paixão do amor do Criador que quer a salvação de todos. Aos pés da Cruz, o Centurião, vendo o que tinha acontecido, deu glória a Deus, dizendo: “Na verdade este homem era justo” (Lc 23,47). Ele fora condenado injustamente dado que era inocente e espelho de virtude.

Jesus foi fiel até à morte, fiel a seu amor infinito para com o Pai, fiel a seu amor infinito pelos homens. Ao aceitar livremente sua Paixão, Ele veio quebrar o dinamismo da morte e do pecado. Martirizado cruelmente em face daquela espiral de violência, Ele se mostrou a toda a humanidade como quem ama e amará até o fim dos tempos aqueles pelos quais se sacrificou. Sobre cada ser humano Jesus crucificado lança um olhar de amor que convida a viver do amor de Deus e pelo amor a Deus. Cristo viveu sua Paixão e Morte em sua vida que foi uma vida entregue totalmente à missão que o Pai lhe confiara. Sua cruz, instrumento de sua Paixão, se tornou o sinal de seus seguidores, ela que foi o trono de sua glória. Ele era um rei que se fizera servidor. Um rei não como os outros reis, mas soberano que veio “para que todos tivessem a vida e a vida em superabundância”. Morrendo por todos os homens, Jesus inaugurou um mundo novo. Contemplando a Cruz do Redentor é necessário entrar na lógica do sua dileção que conduz ao dom de si mesmo, ao acolhimento de todos como irmãos salvos pelo mesmo sangue salvador. Ao morrer por todos os homens Jesus inaugurou um mundo novo. Cada um de nós lá onde a Providencia divina nos colocou precisamos tudo fazer para que não tenha sido inútil tanto sofrimento do Filho de Deus. Chorar como São Pedro nossos erros e abrir os corações à conversão, estando sempre a serviço uns dos outros. Não lavemos as mãos como Pilatos diante das situações de provações e das tribulações inerentes a este exílio terreno. Então, sim, diante da Cruz do Senhor lançaremos onde estivermos o clamor do Centurião: “Verdadeiramente este homem era justo”, repetindo com a Liturgia “Jesus Cristo é o Senhor para a glória de Deus Pai” e esta será, de fato, uma Semana Santa.

*Professor no Seminário de Mariana durante 40 anos.


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