Côn. José Geraldo Vidigal de Carvalho*
Um dos preciosos ensinamentos de Jesus foi registrado por São Lucas: “Guardai-vos de toda cobiça porque a vida de alguém não está na abundância de seus haveres” (Lc 13,12-21). Com relação aos bens materiais é preciso, de fato, que o seguidor de Cristo evite dois extremos: uma espiritualização exagerada e o viver extremamente devotado aos bens, valores e prazeres terrenos, o que agride sua dimensão espiritual. Trata-se de perceber com sabedoria a relação entre a conquista do céu e os bens desta terra. A parábola do rico insensato ilustra com precisão o ensinamento do Mestre divino, concluindo que equivoca lamentavelmente “quem entesoura para si e não é rico em relação a Deus”. O ser humano autêntico que vive em função de seu Criador vale mais do que aquele que possui todas as riquezas deste mundo. Infeliz, realmente, quem se limita apenas ao horizonte terrestre sem o liame vivo com Deus e sua palavra de vida eterna. O cristão sem depreciar as realidades terrestres, engajado no mundo em que vive, está sempre voltado para as realidades além-mundo. Para viver desse modo sabiamente é preciso rogar a Deus: “Ensina-nos a contar os nossos dias” (Sl 90,12). Assim se evita a cupidez, a ganância, valorizando apenas o necessário para a vida, sem legitimar o supérfluo não imprescindível para uma vida digna de um autêntico batizado. Este foge continuamente da idolatria do dinheiro a qual leva a desejos ilimitados, fazendo esquecer as realidades celestes e, nesta terra, olvidando as necessidades dos outros. Tudo para si como bem ilustra a parábola do homem insensato que não refletia que a vida passa e nada se leva para a eternidade, a não ser o uso sensato dos benefícios materiais.
Note-se que Jesus não disse que o dinheiro e as riquezas são maus e inúteis, mas condenou, isto sim, o apego exagerado aos mesmos. Fazer bons investimentos a fim de ter o que é preciso para a manutenção da própria vida e para ajudar os outros não é em si algo condenável. Não se pode é deixar levar pela ilusão da estabilidade e da segurança naquilo que é passageiro, porque a vida passa com o tempo e o principal é aumentar os méritos para o céu. Há, realmente, duas maneiras de conceber nossa existência, ou seja, considerando que tudo termina com a vida terrestre ou considerando que esta vida é apenas uma etapa para a vida eterna. Diante desta alternativa todos devem se posicionar é a magna lição do Mestre divino. Cumpre haver uma coerência total entre o que se crê e o que se vive. Eis, portanto, um ledo engano daqueles que só pensam em se enriquecer mais e mais ou aproveitar ao máximo dos prazeres não cuidando de seu crescimento espiritual. Luta contínua contra todo e qualquer pecado. O referencial deve ser o que acontece além-morte, sendo a passagem por esta terra uma preparação para o encontro definitivo com Deus. Sublime é o destino do ser humano que deve, isto sim, ajuntar um tesouro lá na casa do Pai. Trata-se da verdadeira sabedoria de que fala São Paulo na sua primeira carta aos Coríntios: “É, de fato, de sabedoria que nós falamos entre os perfeitos, não, porém, da sabedoria deste mundo, nem dos príncipes deste mundo, que são reduzidos à impotência, mas falamos da sabedoria de Deus, envolta em arcano, sabedoria escondida que, antes dos séculos, Deus já havia destinado para a nossa glória” (1Cor 12, 6-8). Concita então que “ressuscitados com Cristo procuremos as realidade do alto e não as da terra” (Col 3,1).
A lembrança da aurora eterna deve iluminar o cotidiano da vida do cristão e isto através das horas que passam e não voltam mais. De Deus é que vem toda iluminação perfeita. Eis porque o segredo da existência humana é o amor deste Deus do qual viemos e para o qual caminhamos. Este amor leva, não há dúvida, a usar de tudo que o Criador oferece vivendo cada um somente para Ele. Deste modo, se aguarda amorosamente o dia eterno junto do Pai. É o verdadeiro amor que leva a julgar a maneira de utilizar os bens terrenos. Esta capacidade de amar e de ser amado por Deus é que dá sentido e o valor à vida de cada um, ciente de que o resto é ilusório, com a morte nada de material se leva para a outra vida. Endeusar os bens materiais é, portanto, uma insensatez. Eles devem servir para a própria subsistência, para o sustendo dos familiares, para o progresso da comunidade na qual se vive. O que não se pode é perder de vista o objetivo final de toda vida humana. Os bens materiais a serviço de todos e jamais a escravidão aos mesmos, o que levaria a uma ruina no que tange o mundo futuro. Ruina porque no final da vida se verá com tristeza o mau emprego das coisas recebidas de Deus, as quais deveriam ter contribuído para o bem próprio e do próximo.
* Professor no Seminário de Mariana durante 40 anos.