Quando vamos escolher com os noivos textos bíblicos para a celebração do casamento, um dos primeiros a ser lembrado é da primeira Carta de Paulo aos Coríntios: “O amor tudo desculpa, tudo crê, tudo espera, tudo suporta. O amor jamais passará” (1Cor 13,7-8). É o que muitos chamam de “amor incondicional”.
Mas sempre vem esta pergunta: existe mesmo esse amor incondicional? Como entendê-lo? Há muitas controvérsias. Mas parece que não seria exagerado dizer que, na verdade, não existe um amor incondicional. Haverá sempre alguma condição...
Por exemplo: todos aprendemos que o amor de Deus é pleno, é gratuito, não depende de a gente merecer. Ama porque ama, porque não poderia jamais deixar de amar. Contudo, Jesus também faz a suas exigências: amor, perdão, renúncia, justiça. Nada exige para sermos amados por ele. Mas pede uma contrapartida para alcançarmos a felicidade e a salvação.
Também o amor de mãe é considerado incondicional. “Amo meu filho e nada no mundo vai apagar esse sentimento”. “Amo e não preciso de razões para isso”. Mas não deixa de ter também as suas condições.
Sem um mínimo de exigência, o amor pode se transformar em conivência com o erro, indiferença, descompromisso, falta de interesse. Quem ama de verdade, quem se importa cobra, exige, corrige... “Amor sem exigência é humilhante”.
Não teria qualquer sentido se pais que são humilhados, desprezados, agredidos se calassem ou fizessem de conta que “está tudo bem”. É normal que muitas vezes se sintam ressentidos, com raiva, tristes, decepcionados ou revoltados, quando não percebem um mínimo de valor ou de reconhecimento pelo amor que dão aos seus filhos.
Isso acontece sobretudo quando a droga entra na relação. Com todo amor que os pais têm pelos filhos, amor quase mesmo incondicional, é natural que venham sentimentos como tristeza, vergonha, decepção, impotência, culpa, sobretudo quando vem aquela eterna dúvida: “onde foi que eu errei?!”.
A gente percebe essa angústia também na relação a dois. Quase sempre a pessoa se casa com esse sonho do amor incondicional, para toda a vida, custe o que custar. Quer experienciar um amor que se doa, que faz o possível e o impossível para ver o outro feliz, para perseverar sempre. Quer dar e receber um amor que tudo perdoa, tudo desculpa, tudo crê, tudo suporta.
Mas a realidade muitas vezes nos “puxa o tapete”. Nos arranca das nuvens e nos lança no chão, muitas vezes pedregoso e espinhoso, da realidade.
E então descobrimos, com uma envergonhada decepção, que todos somos, em maior ou menor escala, como diria Ana D’Araújo, “seres da barganha, do ‘toma lá - da cá’, e sempre ficamos à espera de retribuição para tudo o que ofertamos, de uma maneira ou de outra”. E os questionamentos são inevitáveis: “Eu não posso amar sozinho(a)”. “Como posso continuar uma relação onde eu faço de tudo e nada recebo em troca?”.
Essa reflexão vamos encontrar de uma forma muito bonita e profunda nos princípios e propostas do “Amor-Exigente”. Como dizem lá: “Eu amo você, mas não aceito tudo o que você faz”. Aliás, amor pressupõe também a capacidade de discordar da pessoa amada. “A discordância é um sinal de amorosidade, quando feita com respeito”, diz Mário Sérgio Cortela. “Se eu vivo com alguém que sempre concorda comigo em tudo que eu faço, é sinal de que talvez essa pessoa não se importe tanto comigo”. Eu compreendo, perdoo, quero ajudar, mas não aceito tal ou tal coisa. Esse é também o jeito de Jesus. Detesta o pecado, mas ama o pecador. Ama de maneira totalmente gratuita e desinteressada. Mas coloca exigências. Impõe limites. É um amor incondicional que não aceita tudo.
Muitas vezes, o amor incondicional não passa de uma forma disfarçada de permissividade, indiferença, apatia, egoísmo, que pode induzir o outro ao erro e ao vício, ou deixá-lo sozinho na sua luta contra a doença e a fraqueza. E ele pode, sim, se tornar realidade numa relação construída pela verdade, pela honestidade, pela transparência e pelo diálogo amoroso. “O Teu amor sem exigência me diminui; a tua exigência sem amor me revolta; o teu amor exigente me engrandece.” (Pe. Henri Caffarel).
Pe. José Antonio de Oliveira