Pe. Geraldo Martins Dias
Passados 20 anos da primeira Campanha da Fraternidade sobre a juventude (1992), a Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) repropõe o tema na Campanha deste ano, que será lançada no dia 13 de fevereiro, Quarta-feira de Cinzas. A Igreja e a sociedade brasileira são desafiadas a voltar seu olhar para geração digital, no contexto das profundas mudanças que marcam o terceiro milênio.
Se em 1992, a CNBB apontava a juventude como “Caminho aberto” e a considerava como agente “de uma nova evangelização” e como “força transformadora da Igreja e da sociedade”, na Campanha de 2013, o apelo é para acolher a juventude e favorecer seu protagonismo em três dimensões: no seguimento de Jesus Cristo, na Igreja e na construção de uma sociedade fraterna cujas bases sejam a cultura da vida, da justiça e da paz.
Assegurados a acolhida e o protagonismo, está posto o caminho para que o jovem, numa resposta livre e consciente, se apresente diante de Deus que o convoca para construir a civilização do amor e diga: “Eis-me aqui, envia-me”, conforme sugere o lema da CF. O desafio, no entanto, é como concretizar estes dois pilares sobre os quais se assenta o objetivo da Campanha.
A acolhida é, de fato, o primeiro passo para se estabelecer qualquer relação que se queira verdadeira, duradoura e eficaz. Ela exigirá, antes de tudo, liberdade, confiança, lealdade, transparência e respeito. Modelo de quem sabe acolher, Jesus mostra que só há acolhida quando permitimos que o outro venha a nós do jeito que ele é, sem nenhuma exigência de mudança ou adequação aos nossos padrões culturais ou outros quaisquer. O diálogo é que apontará os caminhos da nova relação que se estabelece a partir da acolhida.
Aquele que acolhe precisa sair de si mesmo, de seu mundo, e abandonar os preconceitos para entrar no mundo daquele que é acolhido a fim de conhecê-lo e amá-lo na verdade que traz consigo. Nesta perspectiva, a acolhida ao jovem, por parte tanto da Igreja como da sociedade, exigirá, muitas vezes, uma radical conversão.
O protagonismo juvenil, por sua vez, vem reafirmar o jovem como sujeito de sua história, responsável também pela construção de uma sociedade justa e solidária. São incontáveis os fatos que mudaram os rumos da história, no passado e no presente, protagonizados pela juventude. Um dos mais notáveis em nossos tempos é o facebook, esse surpreendente espaço virtual de relacionamento, criado por quatro jovens (entre os quais um brasileiro) que, na época, não passavam dos 20 anos.
A primeira dimensão desse protagonismo apontada pela Campanha da Fraternidade refere-se à relação do jovem com o Transcendente. Na fé, o jovem encontrará respostas às suas inquietações. Por isso ele é chamado a um encontro pessoal com Jesus Cristo a fim de que se torne seu discípulo-seguidor. A esse respeito, gosto de recordar a homilia do papa João Paulo II, na missa dedicada aos jovens em Belo Horizonte, no dia 1º de julho de 1980. Diz: “Os melhores amigos, seguidores, apóstolos de Cristo foram sempre aqueles que perceberam um dia dentro de si, a pergunta definitiva, incontornável, diante da qual todas as outras se tornam secundárias e derivativas: ‘Para você, quem sou eu?’. A vida, o destino, a história presente e futura de um jovem, depende da resposta nítida e sincera, sem retórica nem subterfúgios, que ele puder der a esta pergunta. Ela já transformou a vida de muitos jovens”.
O jovem é chamado a exercer seu protagonismo também na Igreja, que reconhece nem sempre saber acolher bem a juventude, segundo o texto base da Campanha: “O afastamento da vivência eclesial, violências, mortes e exclusões (dos jovens) ocorrem porque muitas de nossas estruturas eclesiais não abrem suas portas para acolher a realidade e a cultura dos jovens, entender a linguagem deles, cuidar do seu processo de amadurecimento, curar-lhes as feridas”.
O protagonismo juvenil deve se dar também na sociedade. Sua concretização ocorre quando o jovem assume seu ser político e se compromete com a construção de estruturas sociais justas e fraternas. Em cada época, a juventude deixou sua marca na luta pela transformação social. É grande o número de lideranças políticas jovens que fizeram a diferença neste campo.
A crise mundial financeira, por exemplo, fez desabrochar a força e a criatividade dos jovens que chamaram atenção do mundo com o movimento “Os Indignados”, contradizendo os que insistem em identificar os jovens como alienados ou apolíticos. No Brasil, as marchas contra a corrupção têm sido lideradas pelos jovens. É diferenciada também sua participação em outras manifestações como o Grito dos Excluídos, campanhas em defesa da vida, contra a violência e extermínio dos jovens. Além disso, cresce sua presença nos partidos políticos, que organizam sua ala jovem, ainda que aquém do desejado.
Ao recolocar a juventude na agenda eclesial e social, por meio da Campanha da Fraternidade, a CNBB possibilita à Igreja e à sociedade brasileira um olhar crítico sobre si mesmas na sua relação com a juventude ou, se preferirmos, com as juventudes. Esse olhar será profundo e verdadeiro na medida em que a Campanha se tornar mais um tempo de escuta dos jovens do que de fala sobre os jovens.