A Arquidiocese de Mariana, através da Faculdade Dom Luciano Mendes, realizou nos dias 21, 22 e 23 de maio o XXII Simpósio Filosófico-Teológico, iluminado pelo tema “280 anos de criação da Arquidiocese de Mariana: bens culturais da Igreja — salvaguarda, conservação e proteção”. A programação contou com conferências e momentos formativos, visando contribuir para a valorização, promoção e salvaguarda dos riquíssimos bens materiais e imateriais da Primaz de Minas, em sua importância histórica, artística, cultural e, principalmente, religiosa.
O evento foi desenvolvido em parceria com o Seminário São José, e com o apoio do Conselho de Arquitetura e Urbanismo de Minas Gerais (CAU/MG). Este simpósio é resultado das atividades do Projeto Memória, idealizado pela Faculdade Dom Luciano Mendes (FDLM).
A noite de quarta-feira, 21 de maio, foi marcada pela cerimônia de abertura, realizada na Casa de Teologia do Seminário São José, em Mariana (MG). Compuseram a mesa o Diretor Geral da FDLM, Padre Euder Daniane Canuto Monteiro; o Reitor do Seminário São José, Padre Sérgio José da Silva; a vice-presidente do Conselho de Arquitetura e Urbanismo de Minas Gerais (CAU/MG), Ana Paula Costa Andrade.
Também se fizeram presentes à mesa o presidente do Instituto Estadual do Patrimônio Histórico e Artístico do Estado de Minas Gerais (Iepha-MG), Doutor João Paulo Martins; o representante do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) em Mariana (MG), Adenilton Marinho; e a vice-prefeita de Mariana, Sônia Azzi.
Padre Euder fez a abertura oficial e, na sequência, solicitou a Padre Edvaldo Antônio de Melo — Diretor Acadêmico da Faculdade e Coordenador do Curso de Filosofia e também organizador do evento — para apresentar a motivação e os objetivos do respectivo simpósio. Em sua fala, o sacerdote destacou a importância deste evento para a Arquidiocese de Mariana na comemoração dos seus 280 anos. Agradeceu o apoio da CAU/MG, a presença e empenho da arquiteta Sandra Fosque na organização do Simpósio.
Ainda na oportunidade, Padre Edvaldo citou que um dos objetivos e ações a serem implementadas como resultados do XXII Simpósio Filosófico-Teológico é a publicação de um manual dirigido a membros das comunidades que zelam pelos bens culturais e padres responsáveis pela manutenção dos edifícios e obras de arte, através de rotinas de inspeção e cuidados básicos com o acervo.
Em seguida, deu-se início a primeira conferência do evento, intitulada “A importância do patrimônio religioso em Minas Gerais” e apresentada pelo Professor Luiz Antônio da Cruz (EAU-UFMG), especialista em Artes, Letras e na conservação do patrimônio histórico e artístico.
O professor Luiz Antônio manifestou a alegria em participar do evento, parabenizou a Arquidiocese de Mariana pela organização e pontuou os desafios enfrentados na conservação do patrimônio.
“Temos muitos desafios. Acho que um grande desafio é enfrentar a falta de recursos, porque os bens religiosos, as igrejas, as capelas, os bens móveis e imóveis são vastos e, infelizmente, o Ministério da Cultura tem disponibilizado poucos recursos para a manutenção disso. Torna-se um desafio fazer essa manutenção. Precisamos de muita criatividade para fazer com que isso seja conservado”, declarou.
Na manhã do dia 22 de maio, às 8h30, iniciou-se o segundo dia do simpósio com o Workshop “O ensino e a prática da conservação e restauro do Patrimônio Histórico Cultural”, apresentado pela equipe de conservação e restauração da Fundação de Arte de Ouro Preto (Labcor/Faop), no auditório Dom Oscar de Oliveira, na Faculdade Dom Luciano Mendes.
A apresentação foi dividida em dois momentos. No primeiro, a palavra foi conduzida por Cesar Teixeira, que destacou a seriedade do trabalho realizado no Labcor/Faop em relação aos objetos religiosos recebidos para o restauro.
Já no segundo momento, a gerente do Laboratório de Conservação e Restauração, Bianca Monticelli, ressaltou a importância deste curso oferecido pela Faop desde 1970, com objetivo de formar profissionais com especialidade na área da pintura de cavaletes, policromias, restaurações de papéis, dentre outras funções.
Bianca expressou a relevância da conscientização e valorização de patrimônios e objetos culturais, pois quando se fala de patrimônio cultural trata-se de algo material, mas também imaterial, ou seja, aquilo que vai além do físico, como emoções, saberes, lugares etc.
Por fim, ocorreu uma aula prática de como conservar objetos e acervos, como imagens, livros antigos, artigos religiosos de prata, de ouro e quadros, utilizando algodão, flanela, pincel e palitos.
Às 14h30, houve a continuação das atividades do simpósio com o Painel I – Vídeo Conferência, com o tema “A Pastoral da Cultura, Comissão de Bens Culturais, Gestão Integrada dos Bens Culturais da Igreja a Partir do Evento”. O auditório Dom Oscar de Oliveira contou com a presença de discentes e docentes, seminaristas e autoridades civis e religiosas.
Em seguida foi apresentada a conferência sobre “A paisagem Cultural como instrumento de gestão e promoção do patrimônio Cultural em Minas Gerais”, ministrada pelo Dr. João Paulo Martins, presidente do Instituto Estadual do Patrimônio Histórico e Artístico de Minas Gerais (IEPHA-MG). Em sua fala, Dr. João Paulo abordou a importância da preservação de paisagens culturais, ressaltou o Patrimônio Religioso como força transformadora da Paisagem Cultural, enfatizando que todos devem valorizar o que já possuímos.
Ele destacou como o instrumento pode ser trabalhado, dada sua importância paisagística, que constitui espaços em seus movimentos culturais na região de Ouro Preto (MG), Mariana (MG), Santa Bárbara (MG) e Catas Altas (MG). O mestre em História pela Universidade Federal de Minas Gerais também abordou o potencial para ir além do religioso, citando como exemplo a Serra da Canastra, e discorreu sobre propostas de políticas públicas e a gestão de bens culturais em relação ao ambiente e ao entorno.
A partir das 19h30, a noite do mesmo dia, foi marcada por uma videoconferência com a ilustre participação do professor da Universidade de Campinas (Unicamp), Marcos Tognon, o qual abordou a temática “Conservação preventiva do Patrimônio Sacro: metodologia, estratégias e experiências”. O professor frisou um dos documentos do Papa Francisco, a Laudato Si’, evidenciando o número 143, acerca de uma Ecologia Cultural: “É preciso integrar a história, a cultura e a arquitetura de um lugar, salvaguardando a sua identidade”.
Marcos discorreu sobre a necessidade de conservação preventiva, ou seja, cuidar com antecedência de objetos e acervos culturais de grande importância para a história e para um determinado lugar. A conservação preventiva se desdobra em um conjunto de ações aplicadas aos bens culturais materiais, oferecendo um bom estado de conservação. Segundo Tognon, essa prevenção oferece um cronograma, um roteiro e um protocolo.
Na oportunidade, o professor apresentou um dos inimigos da conservação, os quais se encontram presentes na maioria das igrejas históricas: as infestações de cupins. Ele alertou ser preciso tomar as devidas prevenções contra os xilófagos no patrimônio sacro, combatendo-os com técnicas profissionais, como a aplicação de óleo nas peças de telhado, aplicação de óleo no extradorso das peças do forro, dentre outros critérios de grande importância na preservação do patrimônio sacro que não alteram as propriedades visuais e físicas da madeira.
Por fim, o conferencista ressaltou a importância da conservação preventiva com estratégias de planejamento para a preservação dos bens culturais e apresentou vários exemplos de trabalhos de restauração realizados em igrejas pelo Brasil, a saber: a Basílica de Nossa Senhora do Carmo, Campinas (MG); a Matriz de São José e a Igreja de Nossa Senhora do Carmo, em Mogi Mirim (SP).
A primeira conferência do dia 23 de maio, último dia do simpósio, intitulada “Conservação Preventiva e análise de riscos”, foi ministrada pelo professor da UFMG Dr. Willi de Barros Gonçalves, especializado em Arquitetura, Urbanismo, Engenharia Mecânica e Artes e vice-presidente da Associação Nacional de Pesquisa em Tecnologia e Ciência do Patrimônio (ANTECIPA).
Sua apresentação salientou a presença frequente de riscos ao patrimônio artístico, cultural, histórico e religioso, fato que demanda a sua constante análise por parte dos administradores dessa grande riqueza. Nesse sentido, o conferencista sublinhou que no gerenciamento desses riscos deve-se buscar o convencimento das autoridades públicas em relação ao financiamento das ações de preservação dos bens culturais.
Ainda pela manhã, por volta de 11h, houve o painel “Da prática à realidade das Paróquias”, mediada pelo Diretor do Museu de Arte Sacra de Ouro Preto, Carlos José Aparecido de Oliveira; com a participação do Coordenador de Patrimônio da Arquidiocese de Mariana, Efraim Rocha; do membro da Comissão de Bens Culturais, Padre Jean Lúcio de Souza, e do representante da Secretaria Municipal de Patrimônio Cultural e Turismo, Lélio Pedrosa Mendes.
O mediador frisou a importância do inventário como um diagnóstico fundamental da história da Igreja e conservação do Patrimônio. Além disso, trouxe como exemplo o cuidado com os acervos históricos e artísticos do Padre Simões — antigo Pároco da Paróquia de Nossa Senhora do Pilar, em Ouro Preto (MG) — que o inspirou em seu atual trabalho.
Por meio de uma fala afetuosa, o palestrante Lélio destacou seu amor e zelo pela cidade de Mariana (MG), a qual apresentou por uma memória afetiva o legado e a história da cidade e da Arquidiocese desde os seus primórdios. Encerrou sua fala com um comovente trecho de um poema que sintetiza seu apreço e carinho pela história da Primaz de Minas.
Logo em seguida, Efraim Rocha ressaltou o patrimônio como uma percepção exata do que deve preservar e como uma reflexão profunda da realidade de vida de cada lugar, ou seja, tudo o que reflete a história e o modo de vida de uma comunidade, por mais simples que possa parecer.
O Coordenador de Patrimônio afirmou que contar as histórias dos antepassados é preservar o patrimônio e torná-lo vivo. Já no âmbito religioso, ressaltou o patrimônio como algo tomado pela fé, pelo belo e pela forma como foi esculpido, dizendo que as cidades históricas nasceram ao entorno da fé e da Igreja.
À tarde, pouco antes das 15h, deu-se início ao terceiro painel do simpósio, com o tema “A necessidade de preservação do patrimônio cultural da Arquidiocese de Mariana e seus impactos nas cidades”.
As exposições foram mediadas pela arquiteta da Arquidiocese de Mariana, Sandra Fosque, e apresentadas pelo coordenador-técnico da Superintendência Regional do Iphan/MG, André Henrique Macieira; pelo Gerente de Articulação com os municípios — IEPHA, Hugo Mateus Gonçalves Rocha; pela supervisora técnica de Patrimônio Cultural da Plataforma Semente – CeMAIS, Maria Letícia Ticle; e pelo coordenador do curso de Tecnologia em Conservação e Restauração do IFMG, Regis Eduardo Martins.
Durante a última apresentação do XXII Simpósio Filosófico-Teológico, foi lançado o “Manual de Conservação Preventiva dos Bens Culturais da Arquidiocese de Mariana”. O projeto foi apresentado por Padre Edvaldo, pelo Ecônomo da Arquidiocese e Diretor Administrativo da FDLM, Padre José Geraldo Coura (Pe. Juca); pela arquiteta Sandra Fosque e pelo representante da Práxis — Conservação e Restauração, Rafael César da Cruz.
O manual nasce do compromisso com a proteção e preservação do patrimônio cultural, histórico, artístico e espiritual da Arquidiocese. Segundo Sandra, a proposta oferece orientações acessíveis e práticas para o cuidado do patrimônio sacro, despertando nas comunidades paroquiais uma percepção mais consciente sobre a importância da conservação preventiva. Ela também destaca a parceria com a Faculdade Dom Luciano Mendes (FDLM), que contribui na formação dos futuros responsáveis pela gestão dos bens culturais das paróquias.
Texto: Vítor Alves Rodrigues e Silva, Gerlison Ferreira Fernandes, Wesley Lopes Dumont e Pedro Augusto Alves Toledo — adaptado.
Fotos: Prof. Dr. Luiz Antônio da Cruz, Thalles Andrade Torre e André Rodrigues Marques