1- O Papa Francisco lançou a carta apostólica Patris corde no dia 8 de dezembro de 2020 e logo na introdução dessa ele faz referência ao título dado à ela afirmando que São José amou Jesus com o coração de pai, pois os evangelistas Lc 4,22, Jo 6,42, Mt 13, 55 e Mc 6,3 designam Jesus como o filho de José. Mateus e Lucas falam o suficiente para saber que tipo de pai José era e também a missão que Deus o confiou.
2- Explicita que São José era um humilde carpinteiro (Mt 13,55); esposo de Maria (Mt 1,18; Lc 1,27), justo (Mt 1,19), obediente à lei ( Lc 2,22.27.39) por meio de quatro sonhos (Mt 1,20; 2,13;. 19.22). Que ele fez uma viagem cansativa com Maria até Belém onde viu Jesus nascer num estábulo (Lc 2,7) sendo testemunha da adoração dos pastores e dos Magos (Lc 2,1-20).
3- José assumiu a paternidade legal de Jesus e deu-lhe o nome (Mt 1,21); ofereceu o Menino ao Senhor no templo e ouviu a profecia de Simeão a respeito dele e de Maria (Lc 2,22-35). Defendeu Jesus de Herodes e fugiu para o Egito (Mt 2, 13-18) e depois voltou para a pátria indo residir em Nazaré, lugar desprezado onde não podia surgir um profeta (Jo 7,52) e não podia sai nada de bom (Jo 1,46) e por fim José e Maria encontram o Menino depois de três dias no templo entre os doutores da lei (Lc 2,41-50).
4- Em seguida Francisco afirma que depois de Maria, nenhum santo ocupa tanto espaço no magistério pontifício como José, tanto é verdade que seus predecessores realçaram o papel dele na história da salvação seja com Pio IX que o declarou Padroeiro da Igreja Católica com a encíclica Quemadmodum Deus-8.12.1870; Pio XII o declarou Padroeiro dos operários (Discurso às Associações cristãs dos trabalhadores Italianos, dia 1º maio de 1955); São João Paulo II o declarou Guarda do Redentor (Exortação Apostólica Redemptoris Custos, de 15.8.1989) e o povo o invoca como Padroeiro da boa morte( CIC 1014 – 2013).
5- Francisco comunica que por ocasião do 150º aniversário da Quemadmondum Deus, ele tomou a iniciativa de partilhar algumas reflexões pessoais sobre a figura extraordinária de São José, tão próxima de cada um de nós. Esse seu desejo cresceu ao longos dos meses de pandemia, e que se pode experimentar nessa crise que as nossas vidas são sustentadas por pessoas comuns (habitualmente esquecidas) que não apareciam nas manchetes dos jornais e revistas, nos palcos de espetáculos, mas que estavam escrevendo acontecimentos decisivos na história, como são os médicos, enfermeiros, trabalhadores de supermercados, pessoal de limpeza, transportadores, policiais, voluntários, sacerdotes, religiosos e muitos outros que compreenderam que ninguém se salva sozinho.
6- Todas essas pessoas diariamente infundem esperança, responsabilidade, rezam e se sacrificam. Diante disso, diz o Papa, “todos podem encontrar em São José o homem que passa desapercebido, o homem da presença cotidiana discreta e escondida – um intercessor, um amparo para os momentos difíceis. São José faz lembrar que todos aqueles que estão aparentemente escondidos ou em segundo plano, têm um protagonismo sem paralelo na história da salvação”.
7- Depois dessa introdução o Papa passa a considerar sete particularidades da paternidade de São José começando a considerá-lo como Um Pai amado. Ele é um Pai amado porque foi pai de Jesus e dessa maneira se colocou inteiramente a serviço do plano da salvação conforme ensina São João Crisóstomo. Sua paternidade se exprimiu, conforme afirmou São Paulo VI “em ter feito de sua vida um serviço, um sacrifício ao mistério da encarnação e à conjunta missão redentora; em utilizar da autoridade legal que tinha sobre a Sagrada Família para lhe fazer dom total de si mesmo, da sua vida e do seu trabalho; em ter convertido a sua vocação humana ao amor doméstico na oblação sobre-humana de si mesmo, de seu coração e de todas as capacidades no amor colocado ao serviço do Messias nascido em sua casa”.
8- Por essa papel na história da salvação, São José é um pai amado pelo povo como se comprova o fato de numerosas igrejas dedicadas por todo mundo a ele, de muitos institutos religiosos, confrarias, grupos eclesiais terem se inspirado na sua espiritualidade, em terem sido feitas numerosas representações sacras, e em muitos santos terem sido seus devotos apaixonados, dentre os quais santa Tereza de Jesus que o adotou como advogado e intercessor, recebendo graças pela sua intercessão e de persuadir outros a serem devotos dele.
9- A confiança do povo em São José está contida na expressão ite ad Joseph, tratava-se de José, filho de Jacó que se tornou vice rei no Egito. Por isso, José como descendente de Davi de cuja raiz nasceu Jesus, constitui o gonzo que une o Antigo e o Novo Testamento.
10- A segunda característica da paternidade de São José é Pai na Ternura. Como pai, José viu Jesus crescer em sabedoria, idade e graça (Lc 2,52) e o ensinou a andar, segurando-o pela mão, erguendo-o como pai colocando-o ao seu rosto e o alimentando-o; por isso Jesus viu a ternura de Deus em São José, mesmo porque José sabia que Deus é ternura (Dt 4,31; Sl 69,17;78,38 Jr 31,20).
11- A terceira característica da paternidade de São José é Pai na obediência- O papa diz que Deus revelou a José os seus desígnios pelos sonhos, meios pelos quais Deus comunicava a sua vontade. Por isso diante de sua angústia pela gravidez de Maria e não querendo difamá-la José pensava e despedi-la (Mt 1,19), mas no seu primeiro sonho o anjo lhe diz de não a despedir porque ela concebia por obra do Espírito Santo e ele devia dar o nome ao menino (Mt 1,20-21), José fez como lhe ordenou o anjo. (Mt 1,24). No segundo sonho o anjo lhe ordenou de fugir para o Egito (Mt 1,13-15) e José imediatamente obedeceu. José é o homem obediente, mas não é uma obediência passiva, de quem simplesmente faz as coisas, mas uma obediência de quem coloca toda sua inteligência, sua sabedoria e sua responsabilidade em campo. Não por nada o Papa Francisco lembra que, ao voltar do Egito para Nazaré, São José pensou bem qual caminho seguir e que estrada tomar. A sua obediência é permeada de coragem criativa feita de responsabilidade de quem se assume obedecendo. Por outro lado, São José é aquele que aceita profundamente um projeto de Deus, portanto, sabe que não é projeto seu.
12- No terceiro sonho anjo lhe comunicou de voltar com o menino e sua mãe para a terra de Israel (Mt 2,19-21) e José fez como lhe foi ordenado e comunicado pelo anjo. Pela quarta vez em sonho soube da existência de Arquelau, e prudentemente foi morar em Nazaré (Mt 2,22-23). José obedeceu a ordem do imperador enfrentando viagem incômoda de Nazaré a Belém para o recenciamento onde nasceu Jesus (Lc 2,1-7). A obediência de José consistiu também na observância das prescrições da lei como a circuncisão de Jesus, a purificação de Maria, a oferta do primogênito (Lc 2,21-24). Portanto, toda a sua via foi um fiat a Deus. Essa obediência ele a ensinou a Jesus o qual lhe era obediente (Lc 2,51) e Jesus educado na escola de São José fará a vontade do Pai como no Getsêmani (Jo 4,34), na cruz (Mt 26,39; Lc 22,42).
13- A quarta característica da paternidade de José e Pai no Acolhimento- José acolheu Maria sem colocar condições prévias, pois a nobreza do seu coração o faz subordinar à caridade aquilo que aprendera com a lei. José apresenta-se como um homem respeitoso e mesmo não dispondo de todas as informações decide pela honra, pela dignidade e pela vida de Maria. O Papa diz que em nossa vida também acontecem coisas que não entendemos e nossa primeira reação é desilusão e revolta, mas José deixa de lado os seus raciocínios e por mais misteriosa que podia ser aquela situação ele assume a sua responsabilidade.
14- A vida espiritual que José nos mostra não é um caminho a ser explicado, mas um caminho a ser acolhido. Essa atitude de José mostra que ele não é um homem resignado passivamente, mas corajoso ao acolher Maria. Precisamos não temer como José não temeu (Mt 1,20), deixar de lado a desilusão para sermos movidos por uma fortaleza cheia de esperança. Não importa se algumas coisas são irreversíveis, Deus pode fazer brotar flores no meio das pedras, pois “sabemos que tudo coopera para o bem daqueles que amam a Deus” (Rm 8,28), incluindo aquilo que é chamado mal, como diz Santo Agostinho.
15- A fé que Cristo nos ensinou não procura atalhos e esta é a que vemos em São José. O acolhimento de Maria por São José nos convida a acolher os outros sem exclusões, particularmente os mais frágeis e diz, Francisco “gosto de pensar que foi também pelo modo de proceder de José que Jesus tirou inspiração para as parábolas do filho pródigo” (Lc 15,11-32).
16- A quinta característica da paternidade de José e a Coragem criativa – A coragem criativa se encontra em nossa vida sobretudo quando aparecem dificuldades, pois diante de uma dificuldade podemos abandonar tudo ou tentarmos vencê-la e às vezes são essas dificuldades fazem aparecer em nós recursos que nem pensávamos ter.
17- Deus deixa o homem atuar, porque deu a ele a capacidade. José ao ser escolhido como o “coordenador do nascimento de Cristo” recebeu de Deus as graças necessárias, por isso, ele é, como diz o Papa, o homem por meio do qual Deus cuida dos primórdios da história da redenção; ele é o “verdadeiro milagre “pelo qual Deus salva o menino e sua mãe”. Deus confiou na coragem criativa de José, por isso, em Belém preparou um estábulo para o nascimento do Filho de Deus. Depois organizou a fuga para o Egito par salvar o menino.
18- Às vezes podemos nos encontrar em situação de forças mais fortes, mas Deus sempre oferece oportunidade, contanto que usemos da coragem criativa de José, o qual “soube transformar um problema em uma oportunidade, com a confiança na Providência”. Deus confia em nós, mas temos que inventar, projetar, buscar.
19- O Papa lembra a coragem criativa dos amigos do paralítico levado à presença de Jesus fazendo-o descer pelo teto (Lc 5, 17-26). Os desafios não os detiveram e Jesus reconheceu a fé criativa deles. A Sagrada família viveu os desafios da vida no Egito, enfrentou problemas e José nessas circunstâncias teve a coragem criativa, por isso ele é o padroeiro especial dos imigrantes que sofrem em países estrangeiros.
20- José com sua coragem criativa protegeu Jesus e Maria; eles precisaram de José para serem protegidos e cuidados; nesse sentido José não pode deixar de ser o guardião da Igreja porque ela é o prolongamento do Corpo de Cristo e expressa também a sua maternidade refletida na maternidade de Maria. Por isso José protegeu o Menino e sua mãe; assim também devemos amar o menino e sua Mãe.
21- A figura desse menino (Jesus) que José continua protegendo são todos os pobres, atribulados, moribundos, estrangeiros, prisioneiros e doentes, pois Jesus se identifica com esses (Mt 25,40). Por isso, de José devemos aprender os mesmo cuidado e responsabilidade: amar o Menino e sua Mãe, amar a Igreja, os pobres.
22- A sexta característica da paternidade de São José é Pai Trabalhador. Um dos aspectos que caracteriza São José é a sua relação com o trabalho, pois como carpinteiro trabalhou para sustentar sua família e com ele Jesus aprendeu ser trabalhador. O Papa diz que precisa ter a consciência da importância do trabalho, sobretudo nesse tempo de desemprego e de pandemia. Com o trabalho o homem desenvolve as suas potencialidades e qualidades, o trabalho torna-se uma ocasião de realização não só para quem trabalha, mas também para a família e a sociedade. Uma família onde falte o trabalho está exposta a dificuldades e corre até o perigo da dissolução.
23- A pessoa que trabalha colabora com o próprio Deus, por isso ninguém pode ser excluído da possibilidade de trabalhar e a crise do trabalho nesse tempo de pandemia da Covid 19 deve nos fazer refletir sobre a perda de trabalho de tantos trabalhadores. Por isso, é preciso pedir a São José trabalhador a graça de se encontrar meios para que nenhum jovem, nenhuma pessoa, nenhuma família estejam sem trabalho.
24- A sétima característica da paternidade de São José e a sugestiva imagem da sombra, Pai na sombra, título tomado do livro do escritor polonês Jan Dobracznski, o qual em seu romance apresenta José como a sombra do Pai Celeste na terra para Jesus que ele guarda, protege e segue os seus passos sem se afastar dele. Como Deus carregou como quem carrega seu filho por todos os caminhos no deserto (Dt 1,31), assim também José exerceu a sua paternidade em relação a São José.
25- O Papa lembra que não se nasce pai, mas torna-se pai, e não se torna pai somente porque colocou o filho no mundo, mas porque cuida dele responsavelmente. Hoje em nossa sociedade existem filhos que parecem órfãos de pai. Para o Papa a própria Igreja precisa de pai, e os sacerdotes e bispos devem ter consciência disso. Ser pai não significa subjugar o filho, mas torná-lo capaz de opções, de liberdade. Talvez por isso, diz o Papa São José recebeu o título de castíssimo. Evidentemente porque a castidade é a liberdade de posse em todos os campos da vida. O amor que quer possuir sufoca, prende, pois, a lógica do amor é sempre a lógica da liberdade e José soube amar de maneira extraordinariamente livre, não se colocando ao centro, mas colocando Maria e Jesus no centro de sua vida.
26-A felicidade de José se situa na lógica do dom de si mesmo, o seu silêncio não tem lamentações, mas gestos concretos de confiança. Por isso, a exemplo de São José o mundo precisa de pais assim, não dominadores, que não confundam autoridade com autoritarismo, serviço com servilismo… Isso serve também para o sacerdócio e a vida consagrada. Precisa de pais com a maturação do dom de si mesmo não se detendo na lógica do sacrifício, caso contrário essa vocação deixa de ser beleza, alegria e amor e corre o risco de exprimir infelicidade, tristeza e frustração.
27- Um pai sente que completou a sua ação educativa e viveu plenamente a sua paternidade quando vê que o filho se torna maduro e caminha sozinho na vida, quando se coloca na situação de José, que sabia que aquele menino não era seu, mas que a ele tinha se confiado os seus cuidados. O exercício de paternidade não é exercício de posse, mas sinal que remete para uma paternidade mais alta, estando na condição de José: sombra do único Pai Celeste.
28- Por fim o Papa coloca que “o objetivo de sua Carta Apostólica é aumentar o amor por esse grande santo, para nos sentirmos impelidos a implorar a sua intercessão e para imitarmos as suas virtudes”. Salienta que a missão dos santos não é de apenas conceder milagres e graças, mas de serem os nossos intercessores diante de Deus. Eles ajudam todos os fiéis “a procurar a santidade e a perfeição do próprio estado”. Eles são exemplos de vida para imitarmos e São José nos convida a imitá-lo por meio do seu eloquente silêncio.
Texto: padre José Antônio Bertolin – Centro de Espirtualidade Josefino, Apucarana (PR)
Arte: Vatican News
Leia aqui o artigo do Monsenhor Luiz Antônio Reis Costa sobre o ano de São José na Arquidiocese de Mariana na última edição do Jornal Pastoral.