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Em entrevista, padre Edmar fala sobre vivência do Ano da Família na pandemia

08 de junho de 2020 Arquidiocese

A Família foi escolhida para ser o centro das atividades pastorais da arquidiocese neste ano de 2020. Essa prioridade foi assumida em 2017 na Assembleia Arquidiocesana de Pastoral e vem contemplar uma das pistas de ação presentes no Projeto Arquidiocesano de Evangelização (PAE 2016-2020). Devido à pandemia da Covid-19, algumas atividades previstas para celebrar este ano foram canceladas.

Para refletir sobre a vivência do Ano da Família durante a pandemia, o Departamento Arquidiocesano de Comunicação (Dacom) conversou com o coordenador arquidiocesano de pastoral, padre Edmar José da Silva. Leia a entrevista na íntegra:

Dacom: Estamos no Ano da Família na Arquidiocese, como as famílias podem enfrentar juntas este tempo de pandemia?

Padre Edmar: Depois que o novo coranavírus se tornou uma pandemia, as autoridades de saúde viram que o melhor modo de evitar a contaminação das pessoas e a difusão do vírus era manter o distanciamento social. A Arquidiocese de Mariana acolheu logo as orientações da OMS e da CNBB, atenta ao princípio fundamental e inegociável da vida. Neste sentido, a pandemia que, de algum modo, forçou as pessoas a ficarem em casa, obrigou também a igreja a repensar seu processo de evangelização, tendo que usar a criatividade para motivar as pessoas a viverem a fé em família, em casa, na “igreja doméstica”.

Creio que o isolamento social forçado, fruto amargo desta pandemia, aproximou afetivamente as famílias (algumas fisicamente e outras virtualmente) e concedeu a todos a possibilidade de pensar e repensar as prioridades assumidas antes da pandemia e o lugar que a família ocupava neste quadro de valores da existência.A correria do cotidiano e o estresse rotineiro estavam roubando as famílias de si mesmas. Portanto, creio que esta pandemia se tornou ocasião de restabelecer e/ou fortalecer os laços familiares, aguçando o sentimento de cuidado mútuo, de atenção recíproca, de olhar atento para os idosos, doentes e fragilizados da nossa própria família. É deste modo que as famílias devem enfrentar esta pandemia: resgatando valores perdidos e/ou esquecidos, fortalecendo os laços afetivos familiares enfraquecidos pela correria e o estresse do dia-a-dia e aproveitando para intensificar a intimidade com o Senhor, em família.

Dacom: Como ficou a celebração do ano da Família neste período da pandemia?

Padre Edmar: A Arquidiocese de Mariana, nas suas diversas instâncias,havia programado várias atividades pastorais e evangelizadoras para a celebração do ano da família. Porém, com a pandemia, muitas dessas atividades não puderam ser efetivadas devido ao isolamento social e as demais consequências deste problema sanitário que afetou o mundo inteiro. Quando começou a pandeia e as atividades eclesiais presenciais foram canceladas, fiquei muito ansioso e preocupado com o andamento do Ano da família. Hoje, passados quase três meses, tenho um olhar mais sereno e tranquilo quanto a esta questão, porque entendo que os objetivos do Ano Arquidiocesano da Família têm sido alcançados até com mais profundidade e intensidade do que havíamos programado. Deus tem seus caminhos! Se os objetivos principais da celebração do ano da família eram fortalecer os trabalhos de evangelização e resgatar a unidade em torno desta importante instituição, esta pandemia tem possibilitado a concretização destes objetivos. É claro que não podemos ignorar algumas consequências negativas produzidas pela pandemia (violência família, irritabilidade, impaciência, insegurança, medo e etc.), mas têm crescido também o cuidado mútuo, a preocupação com outro, os momentos de oração em casa, as trocas de afabilidade, as conversas em torno da mesa, a reflexão sobre o sentido da existência e etc. Tudo isso está muito conforme ao que foi sonhado e programado para a celebração do ano arquidiocesano da família.

Além disso, não podemos esquecer que alguns eventos estão sendo feitos, ainda que virtualmente, para a celebração do Ano da família. Não está sendo possível efetivar tudo o que foi programado, mas algumas atividades foram readequadas para este período da pandemia.

Dacom: O senhor acha que as famílias devem aproveitar este tempo de isolamento para fortalecer a vivencia da fé em família?

Padre Edmar: Sim. Creio que o isolamento social ofereceu às famílias a oportunidade de cultivar aquilo que nem sempre gera lucro, mas que é altamente humanizante e necessário para a saúde psíquica e espiritual de todo ser humano: a vivência da fé em família. O isolamento social pode ser positivo na medida em que as pessoas aproveitam para fazer aquilo que, antes da pandemia, alegavam não ter tempo para fazer: uma boa leitura, uma reflexão mais profunda sobre o sentido e os rumos dados à própria existência e, acima de tudo, o cultivo da fé em casa, ao lado da família. A Igreja tem aprendido a usar os atuais meios tecnológicos à disposição para alimentar a fé dos fiéis em suas casas, mas cada família vai descobrindo o modo adequado para continuar na presença de Deus, apesar de distante dos templos e das celebrações presenciais dos sacramentos.

Dacom: Quais reflexões e ensinamentos as famílias poderão colher quando a pandemia acabar?

Padre Edmar: Creio que numa releitura de fé e na ótica humanista, podemos colher muitos ensinamentos para as famílias (e para qualquer ser humano) a partir desta realidade desafiante que estamos enfrentando:

1º) Devemos tirar tempo para valorizar as pessoas que amamos, de modo especial, os membros de nossa família. A correria e a agitação cotidiana às vezes nos roubam aquilo que é tão necessário para a nossa saúde integral: a convivência sadia com as nossas famílias e o cuidado para com as pessoas que mais amamos;

2º) Tomar consciência de que o ser humano é frágil, fraco, limitado e não tão onipotente como, às vezes, parecia ser.  Um simples vírus, invisível, foi capaz de derrubar todos os seus planos e seus projetos. Nem o conhecimento científico e nem o grande avanço tecnológico (com todo o valor que possuem) conseguiram frear o novo coronavírus e a sua difusão. Isso mostra que somos frágeis, limitados e, acima de tudo, necessitados do outro humano e do Totalmente Outro que é Deus. Ao comparar a pandemia do coronoavírus como uma tempestade inesperada, o Papa Francisco afirma: “A tempestade desmascara a nossa vulnerabilidade e deixa a descoberto as falsas e supérfluas seguranças com que construímos os nossos programas, os nossos projetos, os nossos hábitos e prioridades. Mostra-nos como deixamos adormecido e abandonado aquilo que nutre, sustenta e dá força à nossa vida e à nossa comunidade”;

3º) Perceber que devemos reservar tempo para coisas importantes que nos humanizam: estar com a família, ler um bom livro, fazer um retiro espiritual, tirar tempo para oração pessoal e familiar, visitar um parente distante, cuidar das pessoas que amamos e etc. Tudo isso alimenta a nossa alma;

4º) O novo coronavírus não respeitou nenhuma fronteira e atingiu o mundo inteiro, daí o nome, pandemia. Neste sentido, devemos crescer na consciência de que somos membros de uma mesma família, a família humana, sujeitos aos mesmos reveses e, por isso, precisamos aprender também a caminhar juntos, unidos, nos apoiando mutuamente. Como afirmou o Papa Francisco “fomos surpreendidos por uma tempestade inesperada e foribunda. Demo-nos conta de estar no mesmo barco, todos frágeis e desorientados mas ao mesmo tempo importantes e necessário: todos chamados a remar juntos, todos carecidos de mútuo encorajamento”. E acrescenta o Papa: “Com a tempestade, caiu a maquilhagem dos estereótipos com que mascaramos o nosso «eu» sempre preocupado com a própria imagem; e ficou a descoberto, uma vez mais, aquela (abençoada) pertença comum a que não nos podemos subtrair: a pertença como irmãos”.

Estes são alguns ensinamentos, dentre tantos outros, que podemos tirar da pandemia do novo coronavírus. Espero que saiamos mais humanizados e mais fortalecidos na fé desta triste e desafiadora realidade.