O Papa Francisco almoçou neste domingo, 19 de novembro, com 1.200 pessoas na Sala Paulo VI, no Vaticano, por ocasião do 7º Dia Mundial dos Pobres.
Antes de iniciar, o Papa deu a sua bênção, agradecendo a Deus pelo “momento de amizade, todos juntos”, pela refeição, por quem a preparou.
As mesas postas, decoradas com flores brancas e amarelas, serviram de cenário para fotografias e selfies que eternizaram um momento inesquecível de acolhimento, atenção, carinho e amor para com todos aqueles que no resto do ano vivem nas ruas na indiferença da cidade e que hoje dividiram a mesa com o Pontífice.
Um almoço organizado pelo Dicastério para o Serviço da Caridade e oferecido este ano pelos Hotéis Hilton, com um menu dedicado a todos, mesmo aqueles que não são cristãos e, portanto, obrigados a observar certas normas alimentares segundo sua religião.
Antes de deixar a Sala Paulo VI, Francisco abençoou e agradeceu a todos os que contribuíram para organizar e servir o almoço num clima de grande festa, aos que ajudaram materialmente para que este pudesse acontecer e, naturalmente, a todos os presentes que partilharam o mesmo espírito.
HOMILIA DO SANTO PADRE
PARA O VII DIA MUNDIAL DOS POBRES
(XXXIII Domingo do Tempo Comum – 19 de novembro de 2023)
Três homens veem-se na posse duma enorme riqueza, graças à generosidade do seu senhor, que está de saída para uma longa viagem. Um dia, porém, vai regressar e convocará aqueles servos, esperando poder alegrar-se com eles pela forma como, entretanto, fizeram render os seus bens. Assim, a parábola que ouvimos (cf. Mt 25, 14-30) convida-nos a deter-nos em dois percursos: a viagem de Jesus e a viagem da nossa vida.
A viagem de Jesus. No início da parábola, Ele fala de «um homem que, ao partir para fora, chamou os seus servos e confiou-lhes os seus bens» (25, 14). Esta viagem faz pensar no próprio mistério de Cristo, Deus feito homem, com a sua ressurreição e ascensão ao Céu. Com efeito, Ele que desceu do seio do Pai para vir ao encontro da humanidade, morrendo, destruiu a morte e, ressuscitando, retornou ao Pai. Assim Jesus, tendo terminado a sua existência terrena, realiza a «viagem de regresso» para junto do Pai. Mas, antes de partir, confiou-nos os seus bens, os seus talentos, um verdadeiro «capital»: deixou a Si mesmo na Eucaristia, a sua Palavra de vida, a sua santa Mãe como nossa Mãe, e distribuiu os dons do Espírito Santo para podermos continuar a sua obra no mundo. Tais «talentos» são concedidos «a cada qual – especifica o Evangelho – segundo a sua capacidade» (25, 15) e, naturalmente, para uma missão pessoal que o Senhor nos confia na vida quotidiana, na sociedade e na Igreja. O mesmo afirma o apóstolo Paulo: «a cada um de nós foi dada a graça, segundo a medida do dom de Cristo. Por isso se diz: Ao subir às alturas, levou cativos em cativeiro, deu dádivas aos homens» (Ef 4, 7-8).
Mas, voltemos a fixar o olhar em Jesus, que recebeu tudo das mãos do Pai, mas não reteve para Si esta riqueza, «não considerou um privilégio ser igual a Deus, mas esvaziou-Se a Si mesmo, tomando a condição de servo» (Flp 2, 6-7). Revestiu-Se da nossa frágil humanidade, cuidou como bom samaritano das nossas feridas, fez-Se pobre para nos enriquecer com a vida divina (cf. 2 Cor 8, 9), subiu à cruz. A Ele, que não tinha pecado, «Deus o fez pecado por nós» (2 Cor 5, 21), em nosso favor. Jesus viveu em nosso favor. Foi isto que animou a sua viagem pelo mundo, antes de voltar ao Pai.
Mas a parábola de hoje diz-nos ainda que «voltou o senhor daqueles servos e pediu-lhes contas» (Mt 25, 19). Com efeito, à primeira viagem rumo ao Pai, seguir-se-á outra que Jesus há de realizar no fim dos tempos, quando voltar na glória e quiser encontrar-nos de novo, para «fazer um balanço» da história e introduzir-nos na alegria da vida eterna. Por isso devemos perguntar-nos: Como nos encontrará o Senhor, quando voltar? Como me apresentarei ao encontro com Ele?
Esta pergunta leva-nos ao segundo momento: a viagem da nossa vida. Que estrada estamos nós a percorrer: a de Jesus que Se fez dom ou a estrada do egoísmo? A parábola diz-nos que cada um de nós recebeu os «talentos», segundo as próprias capacidades e possibilidades. Mas, atenção, não nos deixemos enganar pela linguagem habitual! Aqui não se trata das capacidades pessoais, mas – como dizíamos – dos bens do Senhor, daquilo que Cristo nos deixou ao regressar ao Pai. Com eles, deu-nos o seu Espírito, no qual nos tornamos filhos de Deus e graças ao qual podemos dedicar a nossa vida a dar testemunho do Evangelho e construir o Reino de Deus. O grande «capital», que foi colocado nas nossas mãos, é o amor do Senhor, fundamento da nossa vida e força do nosso caminho.
Por isso devemos perguntar-nos: Que faço eu dum dom tão grande ao longo da viagem da minha vida? A parábola diz-nos que os dois primeiros servos multiplicam o dom recebido, enquanto o terceiro, em vez de confiar no seu senhor, tem medo dele e fica como que paralisado, não arrisca, não se empenha, acabando por enterrar o talento. Isto aplica-se também a nós: podemos multiplicar o que recebemos, fazendo da vida uma oferta de amor pelos outros, ou então podemos viver bloqueados por uma falsa imagem de Deus e, com medo, esconder debaixo da terra o tesouro que recebemos, pensando só em nós mesmos, sem nos apaixonarmos por nada além das nossas comodidades e interesses, sem nos comprometermos.
Pois bem, meus irmãos e irmãs! Neste Dia Mundial dos Pobres, a parábola dos talentos é uma advertência para verificar com que espírito estamos a enfrentar a viagem da vida. Recebemos do Senhor o dom do seu amor e somos chamados a tornar-nos dom para os outros. O amor com que Jesus cuidou de nós, o azeite da misericórdia e da compaixão com que tratou as nossas feridas, a chama do Espírito com que abriu os nossos corações à alegria e à esperança, são bens que não podemos guardar só para nós, administrar à nossa vontade ou esconder debaixo da terra. Cumulados de dons, somos chamados a fazer-nos dom. As imagens usadas pela parábola são muito eloquentes: se não multiplicarmos o amor ao nosso redor, a vida some-se nas trevas; se não colocarmos em circulação os talentos recebidos, a existência acaba debaixo da terra, ou seja, como se já estivéssemos mortos (cf. 25, 25.30).
Por isso pensemos nas inúmeras pobrezas materiais, culturais e espirituais do nosso mundo, nas existências feridas que povoam as nossas cidades, nos pobres tornados invisíveis, cujo grito de dor é sufocado pela indiferença geral duma sociedade atarefada e distraída. Pensemos em quantos estão oprimidos, cansados, marginalizados, nas vítimas das guerras e naqueles que deixam a sua terra arriscando a vida; naqueles que estão sem pão, sem trabalho e sem esperança. Quando se pensa nesta multidão imensa de pobres, a mensagem do Evangelho resulta clara: não enterremos os bens do Senhor! Ponhamos em circulação a caridade, partilhemos o nosso pão, multipliquemos o amor! A pobreza é um escândalo. Quando o Senhor voltar, pedir-nos-á contas e – como escreve Santo Ambrósio – dir-nos-á: «Porquê tolerastes que tantos pobres morressem de fome, quando dispunhas de ouro com o qual obter alimento para lhes dar? Porquê tantos escravos foram vendidos e maltratados pelos inimigos, sem que ninguém fizesse nada para os resgatar?» (As Obrigações dos Ministros: PL 16, 148-149).
Rezemos para que cada um, segundo o dom recebido e a missão que lhe foi confiada, se comprometa a «pôr a render a caridade» e a aproximar-se de qualquer pobre. Rezemos para que também nós, no termo da nossa viagem, depois de ter acolhido Cristo nestes irmãos e irmãs com quem Ele próprio Se identificou (cf. Mt 25, 40), possamos ouvir dizer-nos: «Muito bem, servo bom e fiel (…). Entra no gozo do teu senhor» (Mt 25, 21).